
INVEJA 2
– Sabe o que é? É que não deu muito certo sair por aí, gastando adoidado. Entrei no cheque especial, fiz prestações e tô no vermelho. Por falar nisso, quanto é que você vai me cobrar por sessão, hein?… Como assim, continua falando e a gente vê isso depois? Eu estou sentindo necessidade de fazer terapia, mas preciso saber se vou poder pagar… hein?…Ah, então tá, continuo falando. Mas a verdade é que me sinto meio lesada, sabe? A grama do vizinho sempre me pareceu mais verde do que a minha. É uma sensação que me acompanha desde a infância … Ah, por falar nisso, quanto tempo vai durar meu tratamento?…como não sabe? E se eu ficar aqui muitos anos? …Ah, tá, entendi, vou ter que falar muito, né, te contar coisas do arco da velha. Então, tá, continuemos pois. Desde menina eu brigava muito com a minha irmã, ela me passava a impressão de que sempre se saía melhor do que eu, em tudo. Ela tinha amigas que telefonavam lá prá casa todos os dias, tinha o estojo e o cabelo mais bonito do que os meus e era mais paparicada. Outro dia, conversando sobre isso com minha mãe, eu falei dessa minha impressão e ela, sempre politicamente correta, me disse: “não, que é isso, foi só impressão sua, eu e seu pai sempre te tratamos de forma igual à sua irmã, sempre amamos vocês igualmente.” Daí eu te pergunto: existe isso, de amar os filhos igualmente? Eu vejo lá em casa, tenho 3 filhos. A menina… moça, aliás… bate de frente comigo todos os dias. Tudo que eu falo ela despreza. Já cheguei a achar que ela tinha inveja de mim. O quê? Se eu tenho inveja dela? Ah!…não sei…talvez…talvez da sua juventude…É claro que a amo, mas é uma relação mais difícil. Já com os rapazes é tudo mais tranquilo, eles são mais amorosos, me consideram mais. Sabe que já tive um pensamento meio doido? Cheguei a pensar que gostaria que eles não se casassem pra ficar tomando conta de mim a vida toda. Louco, né? É por isso que tô aqui…mas eu acho que sou uma louca mansa…ha, há, há, há… tem gente pior por aí…É isso que você quer que eu faça? Falar o que me vem à cabeça? Tá bom, mas eu ainda não entendi direito esse negócio…mas já que você diz…então tem o marido…ele é um homem bom, legal, mas eu me pergunto onde a gente se perdeu…você conhece a história da Shirley Valentine? Ah, conhece? Então você sabe do que estou falando…hein?… Falar mais sobre isso…não, é que eu sonho, às vezes, com liberdade, com viagens prá Grécia, com viagens para fora da minha vidinha insossa…não é que minha vida seja ruim, não, mas é que eu quero muito mais. O quê? Já acabou? Passa rápido, hein? Ok, então até a semana que vem. Bonito o seu divã, hein? Queria ter um igual.
Fechei a porta e pensei comigo: “Ai, ai, ai…vou ter que estudar algumas coisas sobre inveja…”
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INVEJA 1
De repente, pegou-se invejando tudo e todos. Tinha inveja da cinturinha de pilão da vizinha, da mansão da irmã, do casamento da colega de trabalho, das roupas da amiga, do salário da chefe…todas mulheres, todas convidadas para uma festa espetacular que ela assistia com o nariz colado na vidraça.
Olhando-se de fora, sua vida era boa e calma, com mil atribuições e muita correria, mas nada de absurdo ou de insustentável. Como dizia São Tomás de Aquino, “o bem alheio é considerado um mal próprio” e “a inveja é a tristeza em relação ao sucesso dos outros”. Nada como um santo para definir bem o que ela sentia. Sim, mas a definição não a ajudava em nada, quando vinha a sensação de borbulhamento no peito, queimando como um ácido, quando seu olho gordo batia nos jardins da casa da irmã. Não gostava da sensação, era incômoda. E, depois, vinha a culpa, sua eterna companhia desde que se entendera por gente.
O que fazer se o sentimento havia eclodido subitamente, sem que ela tivesse podido detê-lo? Não sabia, não entendia, queria sumir.
Em qual filme, mesmo, havia a fala: “você cobiça o que vê todos os dias”? Ah, Hanibal Lecter (Anthony Hopkins), de O Silêncio dos Inocentes, quando traçava o perfil psicológico do serial-killer para Clarice Starling (Jodie Foster). “Você cobiça o que vê todos os dias”.
Mas, por causa disso, não iria sair matando todo mundo. Achou melhor estourar o cartão de crédito e traçar um sorvete triplo.
E eu, cá comigo pensava: “Hum…isso não vai dar certo…” Será? Veremos nas cenas dos próximos capítulos.
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A minha, a sua, a nossa criança interior
Sim, existem pais que, segundo o ponto de vista dos filhos, frustraram suas expectativas, ao não lhes dar o que necessitavam. São aqueles que criticam, não elogiam, que exigem a perfeição, criando no filho a impressão de que ele nunca é e nunca faz o suficiente. São pais que têm dificuldade para olhar no olho, que não conseguem escutar os sentimentos expostos, que deixam os pequenos se virarem, quando ainda estão em formação da personalidade. Falta chão, parede e teto a esses filhos, porque carecem de um adulto responsável, amoroso e disponível, no qual se apoiar.
O que muita gente não sabe é que a vida pode ficar estagnada porque a criança interna está descuidada. Esses adultos infantis não prosperam, não passam no vestibular, não conseguem manter relacionamentos amorosos satisfatórios, não ganham dinheiro, não têm boa autoestima e aceitam migalhas de todos, para não morrer de fome; em suma, não deslancham em uma ou mais áreas da vida, sob a tutela de uma nuvem cinzenta que lhes acompanha diuturnamente. Não cabe juízo de valor sobre os motivos desse comportamento paterno, pois não sabemos as circunstâncias em que os fatos se deram. Talvez – é uma hipótese – os pais não tenham recebido de seus próprios pais. E esses, por sua vez, também podem ter crescido carentes e, por isso, não amadureceram. Então, não poderiam, mesmo, dar o que não têm. Logo, o que aparece é a ferida exposta e sangrante.
No filme Duas Vidas, lançado em 2000, o personagem de Bruce Willis, Russ Duritz, tem a chance de se encontrar com seu pequeno “eu”, aos 8 anos de idade. Uma criança que foi marcada pelo medo intenso do pai, ao perceber que sua esposa estava morrendo e que teria que criar sozinho os filhos pequenos. Russ adquire um tique facial, no momento em que o pai, apavorado, lhe revela a doença da mãe. Além dessa aquisição física, Russ torna-se um homem arrogante e hipócrita, armaduras contra a sua natureza afetiva. O filme é emocionante e demonstra, claramente, que podemos revisitar o passado – senão literal, pelo menos simbolicamente – e colocar no colo aquela criança, carente emocionalmente.
Uma ferida dói. Todos já nos ferimos. Os profissionais de saúde sabem que, para haver cicatrização, é necessário limpar bem a chaga e extirpar toda secreção ou sujeira. Enquanto se limpa a lesão, sentimos dor. Mas só assim haverá reparação completa dos tecidos.
Limpar a ferida emocional requer falar sobre ela, “dar nome aos bois”, nomear os sentimentos, metabolizá-los e drená-los de forma eficaz; Requer pesquisar o passado de seus próprios pais e reconhecer que eles, provavelmente, também têm chagas não tratadas; Requer sair da posição de vítima e deixar de execrar o suposto vilão, fazendo as pazes com quem lhes deu a vida, ainda que isso possa parecer complicado. E requer assumir a responsabilidade pelo autoconhecimento, de modo a passar da infantilidade para a “adultice”.
Todos esses aspectos são abordados pela Psicoterapia Breve, que, como o próprio nome diz, demanda um tempo menor de tratamento, mas não precisa ser apressada. Que obedece a um tempo interno, não ao tempo cronológico e, portanto, pode durar alguns meses, dependendo da profundidade da lesão. De qualquer forma, o primeiro passo é COMEÇAR!
*Constelação: http://psicologia.escritaquecura.com.br/constelacoes/

Sobre a negação da morte e a beleza das flores
Depois de amanhã, na ressurreição, tudo será festa e o sol brilhará mais forte. Depois de amanhã…porque, agora, gostaria de falar sobre esse assunto tão desagradável e tão presente em nossas vidas.
Dizer que a morte é a única certeza que temos é frase feita e não nos toca quase nada, a não ser que a pessoa que partiu seja um ente muito querido. Então, entre lágrimas e soluços, nos pegamos a pensar: Qual o sentido disso? Pra que viver, se todos morreremos? Poderia ter sido de outro jeito? Será que quando nossa hora chegar, não haverá, mesmo, nada a fazer? Mil elucubrações mentais que não nos aliviam no momento da dor.
O cenário tem um efeito contrário para Freud. Para ele, a finitude da beleza aumentava o seu valor: “Uma flor que dura apenas uma noite nem por isso parece ser menos bela”, diz ele. Sábio Freud! Abrir-se à irreversibilidade do tempo significa abrir-se para a possibilidade de desfrutar o instante presente, sem ter a necessidade desesperada de garantias futuras. Aceitar o que vem e o que vai, na paz da alma, significa, simplesmente, viver as possibilidades que se apresentam, sem pressa, sem expulsão, sem negação. Aceitar, simplesmente. E deixar fluir…

Uma demanda de amor
A senhora de 65 anos, funcionária durante anos naquela instituição pública, perguntou à enfermeira em que data seria aplicada a vacina antigripal. A moça informou-lhe que ainda não havia sido definido o período. Foi o bastante para que ela disparasse, exaltada:
– É um absurdo o que vocês fazem com os aposentados! Como é que essa Casa se esquece assim da gente? Eu vou fazer uma reclamação, porque vocês deveriam comunicar a todos os aposentados sobre os programas de saúde que fazem aqui. Eu sei que tem muitos! Mas…não! Vocês não avisam nada! Eu vou reclamar disso!

Expulsar os EUS que não são MEUS
Qual é a voz que você ouve quando tem vontade de fazer algo, por puro PRAZER, mas se contém? É a sua mesmo? Ou é a da sua mãe?… Seu pai?… Seu marido?… Namorada?…Avós?
De QUEM é voz que diz:
– Não adianta tentar, na nossa família ninguém prospera, mesmo!;
– Estudar no exterior? Tá louca? Na nossa família, nunca ninguém saiu do País!;
– Na nossa família todo mundo é funcionário público, você também tem que fazer um concurso;
– Vai viajar de novo nas férias? Nossa, como você viaja! Por que você não põe esse dinheiro na poupança?;
– Acabou de comprar a roupa e já vai vestir? Deixa pro final de semana!;
– Você não vai guardar esse dinheiro? Olha, que o País tá em crise, hein? Você pode precisar dele depois…E se você ficar desempregado?;
– Jura que você vai dar essa festa? Pagar esse dinheirão todo pro povo comer e beber e ainda sair falando mal?;
– Por que você não compra esse, que é R$ 10,00 mais barato?
E assim, pouco a pouco, vamos instalando dentro de nós o germe da precariedade, da privação, do prazer proibido, do pecado…
Calar essas vozes dentro de nós – heranças familiares – não é fácil. Talvez o melhor seja ouvi-las, reconhecer que não nos pertencem, honrá-las e pedir liberação aos nossos antepassados para seguirmos nosso próprio destino. E tentar fazer um pouco diferente para que nossa descendência também possa ser livre para fazer do seu próprio jeito.


Trabalhar: prazer ou punição? Por que é tão difícil trabalhar?
Entreguei a chave e o cartão ao manobrista e ele, titubeando, perguntou ao companheiro:
– Você pega o carro dela?
– Eu, não. Ainda tô em horário de almoço e não vou trabalhar nem um minuto de graça.
Fiquei perplexa! Não porque ele não estivesse disposto a trazer o carro dessa que vos escreve. Mas, sim, pela preguiça e má vontade. Pela falta de gentileza. Pela dificuldade do rapaz em pensar além do aqui e agora…
Ninguém é obrigado a trabalhar de graça. Isso é escravidão e sobre esse tema nosso país foi mestre durante anos. Escravidão ainda existe, de forma explícita e disfarçada, em vários pontos do planeta e as manchetes dos jornais apontam para o fato, de vez em quando. As pessoas de boa índole a querem extinta. Mas, a eficiência do profissional – seja ele de que área for – sua presteza, educação, astúcia e simpatia, são pontos a se considerar e a conquistar o cliente, que, grato, tenderá a recompensá-lo.
No estacionamento que citei havia um rapaz correto, sério e produtivo. Avisei-lhe, logo no começo, que tinha um horário diferenciado e uma vida tomada por inúmeros compromissos ao longo do dia. Portanto, precisava do carro tão logo chegasse. Perguntei – lhe se achava possível agilizar o processo. Só precisei pedir uma vez. Todos os dias, eu mal apontava e ele já trazia o carro. Passei a lhe dar uma gorjeta toda sexta-feira e a lhe levar presentes, de vez em quando. Como trabalhava bem demais, os colegas se acostumaram e passaram a fazer corpo mole. Sobrava tudo pra ele. Foi punido com excesso de trabalho porque levava sua função a sério. Até que encheu-se. Pediu demissão. Disse-lhe para deixar o email e o telefone, pois acreditava que não ficaria desempregado por muito tempo. Pouco depois, meu marido arrumou – lhe um emprego com uma amiga, proprietária de outro estacionamento. Não sei se ele continua por lá, mas é o tipo de pessoa que não tem medo de botar a mão na massa e sabe que precisa ganhar o pão com dignidade.
O que quero dizer, com todo esse discurso, é que sua função não requeria muita astúcia nem estratégias para desempenhá-la. Mas, mesmo sendo um trabalho bastante automatizado e corriqueiro, ele conseguia imprimir uma qualidade inigualável no desempenho do mesmo. Isso era dele! Suas qualidades pessoais e profissionais estavam marcadas naquilo que ele fazia, porque estavam gravadas no seu jeito de ser.

Como eu aprendi a nadar…e a falar italiano
Sempre tive vontade de aprender a nadar mas o medo me impedia. Sonhava que morria afogada, que não achava o fundo da piscina e pensava que jamais conseguiria dar um impulso na parede e deslizar suavemente.
O Luiz, meu professor de hidroginástica, pegou no meu pé.
– E aí? Vamos começar as aulas de natação quando?
– Hein? Ah…quando eu entrar de férias.
– E quando é isso?
– Dezembro.
No dia 03, ele me cobrou:
– Já tá de férias? Já é dezembro.
– Ah…dia 5 eu começo.
Com meus óculos novos, fui para a primeira aula aprender a fazer…borbulhas. Difícil demais enfiar o nariz dentro d’água. Mas consegui terminar os exercícios.
Na aula seguinte, exercício com a prancha. O Luiz explicava tudo e dizia:
-Vai!
Eu travava e respondia:
– Não vou!!!
E “São” Luiz, na maior paciência, morria de rir e explicava de novo.
Na 5ª aula, quis desistir. Fui estimulada pela minha filha caçula, à época com 7 anos.
– Você vai conseguir, sim, mamãe; olha, eu te ensino. Você faz assim, ó…e assim…
Não sei bem como – nem por que – fui em frente. Acho que queria provar para mim mesma que era capaz. Ainda que fosse muito…muito difícil entender como pulmões, pernas, pés e braços podiam funcionar em sincronia. Se batia as pernas, engolia água…se movia os braços, esquecia as pernas. Uma doideira!
Só sei que no dia 5 de janeiro…estava nadando! No começo, atravessava a piscina de 25 metros e chegava bufando ao outro lado. Tinha que parar para me recuperar. Aos poucos, fui conseguindo. E hoje, 3 anos depois, nado 1.800 metros, 3 vezes por semana. Nada mal para quem morria de medo de uma simples pranchinha.
Foi assim também com o italiano. Na primeira aula, a professora, à porta da minha casa, disparou: “Ciao, come stai?”. Engatei um sorriso amarelo, balancei a cabeça e fiquei olhando pra ela, sem saber o que responder. A cada novo tempo verbal, eu podia sentir a fumacinha saindo dos meus neurônios. Mamma mia, che paura! Também não sei como, mas, de repente, tudo começou a fazer sentido e eu comecei a escrever, a ler, a entender e a falar. Após 4 anos de estudo, tive que interromper as aulas por falta de tempo. Mas ainda pretendo retomá-las.
Só sei que me dediquei às novas atividades. Muito! Estava sempre na internet, pesquisando vídeos sobre nado de peito, de costas, crawl…Borboleta não, porque acho muiiiiito cansativo. E encontrei uns internautas italianos, que muito me ajudaram no aprendizado do idioma.
E, olha, se eu aprendi a nadar e a falar italiano, acho que qualquer um consegue. Essas e outras coisas, desde que o motor seja a paixão, a dedicação, o envolvimento e o desejo real.
Agora, só não me peçam para aprender alemão. Isso, para mim, já é demais.
E você? O que deseja fazer mas pensa que não consegue?
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Padecer no Paraíso – texto escrito em homenagem ao Dia das Mães
Levei minha filha mais nova ao pronto atendimento de um hospital infantil. Nada grave, somente dor de garganta e uma obstrução nasal que a impediu de dormir – e a mim também.
Enquanto aguardo o monitor chamar nossa senha, observo. Na sala de espera, muitas mães e alguns pais, com seus filhos de todas as idades. Muito choro infantil, muita inquietação. Mães se levantam e passeiam pelo corredor, na tentativa de acalmar seus bebês. Outros pais conversam entre si, partilhando as dores de suas crianças.
Começo a pensar que, ao nos vir a vontade de ter filhos, não sabemos o que nos espera. Não sabemos, mesmo! Queremos um bebê Johnson’s, bochechudo e risonho, a iluminar nossos dias. Inferimos – muito teoricamente – que trocaremos muitas fraldas, que dormiremos pouco, que não poderemos – por um bom tempo – passar o carnaval em Salvador, que nosso dinheiro acabará antes do final do mês… Sabemos tantas coisas… racionalmente.
Mas nada – nem ninguém – nos prepara, verdadeiramente, para as emoções avassaladoras que brotam do coração quando pegamos nosso pequeno – ou pequena – nos braços.
E para o cansaço ininterrupto que transforma a outrora estável mulher em uma chorona descontrolada.
E entre aleitamento, banhos, noites não dormidas, papinhas, frutinhas e vacinas, vamos rompendo os anos.
E chega a hora de voltar ao trabalho. Babá, escolinha ou vovó?
E o coração não bate mais por si só, pois uma parte dele bate no corpinho de outra pessoa. E enquanto nossos filhos riem, brincam, brigam, somos felizes. Mas basta uma dor, um choro, um machucado, uma falta de apetite naquele que antes comia um boi no almoço e ficamos infelizes. E preocupados. Preocupação essa que se perpetua pela vida afora, principalmente quando irrompe a adolescência e temos a nítida sensação que alienígenas se apossaram das mentes e dos corpos dos nossos filhos, transformando-os em seres irreconhecíveis. Aí é que a gente põe a unha na cabeça, mesmo! “Oh, céus! Por que não me avisaram que meu bebezinho bochechudo se transformaria…nisso? Será que algum dia o terei de volta?”. Não, não o teremos nunca mais. E isso dói!
Para nós, que assumimos a função materna com unhas, dentes, cabelos desgrenhados e olheiras, o filho pode chegar aos 50 anos, mas, mesmo assim, ainda achamos que somos onipotentes e podemos curar suas feridas, suas desilusões amorosas e suas frustrações estudantis – profissionais.
Nada nos prepara para a dor-amor de ter um filho. Não há escola oficial para aprendermos a ser pais. Estreamos no papel tão logo nos nasce o pimpolho. E vamos passando de ano, às vezes com louvor, as vezes em recuperação. Mas nunca somos reprovadas porque, apesar de não fazermos tudo com perfeição, nossa intenção sempre é das melhores. Como diz minha sábia mãe: “Pé de galinha não mata pinto!”.
Apesar disso, muitas vezes temos vontade de comprar uma passagem de ida para algum lugar e, até, de tirar férias da gente mesma. Uma parte de nós deseja ardentemente a liberdade perdida. A liberdade da despreocupação, da cervejinha inocente e das tardes de domingo ressonando no sofá. Mas nos sentimos culpadíssimas por pensar assim. Afinal de contas, quantas mulheres desejam ter um filho e recorrem a métodos não naturais para isso? E nós, aqui – com um, dois ou três seres que carregam nossa carga genética – querendo sair de casa sem ter hora para voltar…
Alguns não dão conta (muito mais pais do que mães): abandonam o ser que geraram e somem no mundo. Seus recursos físicos e psíquicos foram inferiores às exigências da mater/paternidade. Quem pode culpá-los? Todos temos telhado de vidro, portanto, não é recomendável atirar a primeira pedra, sem se inteirar do tamanho da questão.
Para os que ficam, um efeito colateral muito positivo surge desse processo: Passamos a entender e respeitar nossos pais, porque inferimos que eles, também, podem ter passado por todas essas dificuldades que ora experimentamos. Passamos a honrá – los e a agradecer-lhes a vida que recebemos através de seus genes, de suas crenças e valores. E, mesmo aqueles que não conseguem reconhecer o valor dos pais que têm ou tiveram, seja por qual motivo for, não conseguirão se livrar do fato de terem recebido a vida através de determinado homem e determinada mulher. É algo que os acompanhará através das gerações futuras.
É isso: matamos e morremos por um filho, apesar de tanta preocupação, desgaste, cansaço e dores de cabeça e na alma. Como diz o delicado texto de Affonso Romano de Sant’Anna, “Antes que eles cresçam”, (http://www.portaldafamilia.org/artigos/texto001.shtml), só aprendemos a ser pais quando nos tornamos avós. Porque as exigências da maternidade se contrapõem à doçura da “avozidade”.
Fico por aqui. Chamaram nossa senha…
Ivana Rocha
Psicologia Via Internet
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Carnaval – Quem não usa máscaras?
“Não se pode dizer ao certo a origem das máscaras, mas sabe-se que elas têm uma longa história. Foram usadas como símbolo de comunicação ou de disfarce; serviram para proteger o rosto de guerreiros em combate e como enfeites religiosos.
Já representaram o bem e o mal, divindades, espíritos e deuses. Até mesmo já foram artigos de luxo nos salões europeus e consideradas como jóias preciosas. Já foram de ouro, aço, pano, papel e até de couro de animais.
Permitiam aos atores de teatro a apresentação de vários personagens em um único espetáculo. Aliás, a própria palavra “pessoa” vem de “persona” que era o nome da máscara que os atores do teatro romano usavam. Sua função era tanto dar ao ator a aparência que o papel exigia, quando ampliar sua voz permitindo que fosse bem ouvida pelos espectadores. Por extensão, designa um papel social, ou a máscara ou aparência que uma pessoa apresenta ao mundo.
E, é no carnaval que ela encontra seu auge, pois durante os dias de folia as pessoas se permitem, ao usá-las, vivenciar algumas fantasias e representar papéis diferentes dos seus no dia-a-dia.
Mas, será que é só no carnaval que se usa máscaras?
Quem não usa máscara no dia-a-dia?
Quem nunca se pegou agindo de modo disfarçado? Lembra-se daquela vez que você disse que foi “um prazer” conhecer ou encontrar determinada pessoa e na verdade foi tudo um grande desprazer? E, durante uma entrevista de emprego onde você extremamente nervoso, tenta aparentar calma e controle da situação?
Pois é, todos nós usamos máscaras de vez em quando e podemos dizer que, até certo ponto, usá-las torna nossa convivência mais tranqüila, nos proporciona ganhos, evita situações desagradáveis e em muitas ocasiões, tornam-se até necessárias à nossa sobrevivência social.
Entretanto, precisamos ficar atentos, pois, muitas vezes exageramos na dose. Insistimos em usá-las indiscriminadamente em nome da manutenção da paz, harmonia e felicidade, só que dos OUTROS.
Vivemos num mundo que insiste em nos padronizar, nos modelar e quando nos damos conta, estamos infelizes, pois passamos a priorizar o que os outros esperam de nós e nos esquecemos de nós mesmos.
Levantamos de manhã, colocamos nosso falso figurino, incorporamos nossas máscaras e seus respectivos papéis e assim vamos para o nosso cotidiano tentando nos adequar a um modelo pré-estabelecido e fazer parte da maioria.
E, assim vamos vida afora, colocando nossas máscaras: A da felicidade e sorrisos quando na verdade queremos chorar, não nos dando a oportunidade de tomar consciência dos próprios sentimentos.
A de empresários (as) de sucesso, mesmo que por dentro estejamos nos sentindo vazios.
A da saúde perfeita, mesmo estando doentes físicas ou emocionalmente, impedindo-nos de buscar ajuda com algum profissional.
Ou a de doentes agindo como mendigos afetivos pedindo carinho e atenção.
A de mulheres maravilhas tentando bravamente sermos excelentes em tudo o que fazemos, não nos permitindo errar em hipótese alguma.
A de vítimas permitindo abusos, ouvindo insultos e permanecendo mudos, estáticos e infelizes.
Você percebe o quanto são infinitas as nossas máscaras? A cada uma que usamos assumimos comportamentos inerentes a ela, mas nem sempre representam o nosso verdadeiro desejo.
Nos armamos como se fossemos gladiadores modernos num grande batalha. Buscamos desesperadamente o melhor posto dentro de uma empresa, fazer o que a maioria faz, temendo sempre que logo ali na esquina da vida, apareça alguém melhor capacitado e que ganhe de nós uma disputa que talvez nem nos traria felicidade.
É obvio que buscar, progredir, almejar, lutar pelo melhor é muito saudável e faz parte da natureza humana, mas a que preço? Em que grau?
Acredito que os extremos são sempre perigosos, buscar faz parte da vida sim, mas viver apenas em função desta busca é um convite à depressão, à ansiedade, à frustração e àquele sentimento de inadequação constante que permeia nossas vidas quando não estamos agindo em conformidade com nossos mais puros sentimentos.
Quando nos acomodamos às nossas máscaras, deixamos de nos conhecer, atuamos como personagens em tempo integral, apenas hóspedes do nosso próprio corpo. E, corremos o risco de vivermos uma vida inteira sem jamais descobrirmos nossos valores e competências.
Parece que nesta busca insana em enquadrar-se nem nos questionamos mais se estamos sendo autênticos e agindo de acordo com nossos desejos. Aliás, quando nos perguntam quais são nossos verdadeiros desejos, precisamos parar para pensar e até lançar mão de algum esforço mental no sentido de localizá-los em nossos porões do esquecimento.
Dentro da minha vivência profissional encontro pessoas que me dizem que não sabem exatamente porque se sentem infelizes ou depressivas, alegam ter o que necessitam e que mesmo assim ainda se sentem tristes. Relatam ainda que em muitos momentos almejam ferozmente determinadas aquisições, sejam materiais ou não, e que quando as conseguem entram em profunda frustração. Tal qual aqueles cães que latem desesperadamente para as rodas dos carros, mas que, quando os carros param não sabe o que fazer!
Entretanto, se a sociedade insiste em nos enquadrar, a vida insiste em ser autêntica e descortinar.
Com o tempo nossas máscaras começam a desgastar-se, a desajustar-se do nosso eu e inutilmente tentamos repará-la disfarçando as rachaduras.
Proponho então que, ao invés de investirmos energia tentando “consertá-las”, que utilizemos esta mesma energia num processo de autoconhecimento buscando cada vez mais a autenticidade do nosso ser.
Dentre tantos desafios que temos na vida, talvez seja este o maior de todos, o de tirarmos nossas máscaras e sermos nós mesmos.”
(Texto de Sílvia Rodrigues)
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